sábado, 23 de maio de 2015

O delicioso ouriço-do-mar e uma receita com Spaghetti



O ouriço-do-mar, aberto, com seu coral ou gônadas (foto de João Lombardo)

Comi pela primeira vez gônadas de ouriço-do-mar, popularmente chamadas de ovas ou coral, no Sushi Lika, na rua dos Estudantes, em São Paulo. O Lika atende há poucos metros de onde funcionou o Tanji, um dos mais antigos restaurantes japoneses da capital paulista. Um endereço do qual sou habituée. Pedi ouriço motivado por um fato: havia visto uma reportagem mostrando um pescador abrindo o ouriço-do-mar e comendo as gônadas dentro de um pequeno barco, na ensolarada costa da Sicília, na Itália. Fiquei desejoso daquilo. Quando vi no cardápio do Lika, não hesitei. A sensação gustativa foi muito interessante. A textura amanteigada das gônadas amaciaram meu paladar. O gosto veio foi carregado de tendência doce. Pasmem, a sensação que tive ao provar os corais pela primeira vez foi de estar comendo algo com um toque de baunilha.

Essa sensação se confirmou nas vezes seguintes em que provei o que posso chamar de iguaria. Uma vez em Santiago, pedi uma porção de Erizos del Mar, as maravilhosas gônadas retiradas de equinodermos saídos do gelado mar do Chile. Foi no restaurante Miraolas, um excelente endereço para se deliciar com a culinária litorânea do país. A porção, bastante generosa, veio acompanhada por pão e salsa verde, uma mistura de cebola e salsinha, tudo bem picadinho. Devorei, junto com um gostoso Chardonnay Santa Ema, fresco e com bons aromas. O gosto abaunilhado, guardado na memória desde o Lika, voltou ao meu paladar. Mais uma vez fiquei encantando com essa iguaria delicada e quase doce.

A porção de Erizos del Mar do Miraolas (foto de João Lombardo)

Os ouriços-do-mar são muito apreciados no Japão, onde são chamados de uni, e na Europa mediterrânea. O que se come desse equinodermo é a parte reprodutiva, as chamadas gônadas. Elas também são muito apreciadas em países do continente americano, como o Chile, Estados Unidos e alguns estados brasileiros. Mas não é fácil encontrar ouriços em restaurantes, no Brasil. Por isso, são tratados como iguaria.

Em Florianópolis, comi as ovas pela primeira vez em forma de um patê preparado pelo chef/pescador Narbal Corrêa, no restaurante Recanto dos Brunidores, na praia do Santinho. Hoje Narbal está em seu Centro Gastronômico Rita Maria, no centro de Floripa. Ele refogou cebola num pouco de manteiga clarificada, puxou as gônadas nessa mistura, temperou com sal e aveludou o preparo com nata fresca. Devoramos aquilo com pão italiano. Com a cebola, a manteiga e a nata, a tendência doce desse ingrediente cresceu. E o conjunto tornou o preparo ainda mais dócil ao paladar.

O patê de ouriço do Rita Maria (Foto de João Lombardo)

Para concluir a história, comi gônadas de ouriço de uma outra maneira em Milão, no restaurante Isola del Tesoro, do qual também sou habituée quando estou na cidade. O Isola del Tesoro é um restaurante sardo, na capital italiana do moda. A última vez em que estive ali, provei um prato fantástico: Spaghetti ai Tre Orgasmi, elaborado com vongole veraci, bottarga ricci di mare, os ouriços-do-mar. O prato estava fantástico. O aroma de maresia era entremeado pelas notas da massa, que funcionava como moldura para esses três nobres ingredientes. Acompanhei esse prato com um fresco Pinot Grigio do Vêneto. Ficou perfeito!

Tornei-me fã dessa iguaria que, sempre que posso, peço à mesa. Para os leitores, deixo uma receitas inspirada no prato que comi no Isola del Tesoro. Uma receita possível de se fazer hoje em Florianópolis, no litoral de Santa Catarina e do Brasil.

Spaghetti ai Tre Orgasmi, do Isola del Tesoro (Foto de João Lombardo)

Spaghetti com Bottarga, Ouriço e Berbigão

Ingredientes:

180 g de spaghetti
Bottarga ralada a gosto
20 berbigões na casca
1 dente de alho amassado dentro da pele
Gônadas de ouriço-do-mar
Azeite de oliva
60 ml de vinho branco
Sal, o necessário
Salsa picada
Água com sal para cozinhar a massa


Modo de fazer:

  • Coloque a massa para cozinhar em abundante água fervente temperada com sal.
  • Aqueça o azeite numa frigideira, coloque o alho amassado com a casca e deixe refogar por um minuto.
  • Acrescente o berbigão e salteie.
  • Regue com o vinho branco e tampe a frigideira, para cozinhar os moluscos.
  • Assim que as conchas abrirem, coloque os corais de ouriço e incorpore.
  • Escorra o macarrão e incorpore ao preparo.
  • Rale a bottarga sobre a massa e salteie para misturar bem.
  • Corrija o sal e polvilhe a salsa picada.
  • Sirva quente, com um vinho branco fresco e com boa aromaticidade.


quinta-feira, 14 de maio de 2015

Gnocchi: pelotinhas de sabor


As batatas chegaram à Europa e à receita de gnocchi (foto de João Lombardo)

Gnocchi, em italiano, é plural de gnocco, uma bola de massa feita a partir de batatas, farinha de trigo e ovos. Essa conjugação de três ingredientes gera uma das massas italianas mais apreciadas no mundo. Com muitas variações: ghocchi de batata, de abóbora, de mandioquinha (batata-salsa), de mandioca, pão, espinafre, beterraba, semolina e farro, para citar alguns ingredientes. Um preparo fácil e gostoso de fazer, mas que exige cuidados na hora de colocar a mão na massa.

Os gnocchi são um preparo muito antigo. Originalmente a palavra gnocco significa grumo, pelota. Em português escreve-se nhoque. Antes da chegada da batata à Europa essas pelotinhas ou grumos eram produzidos com ingredientes diversos: castanhas, farinha de milho, farinha de trigo, pão. A chegada da batata, levada ao velho continente pelos espanhóis no século XVI, fez dela o principal ingrediente desses bocconcini di pasta. A batata é um carboidrato que combina com praticamente tudo na cozinha. E o resultado foi o nascimento uma massa tenra e delicada, aromatizada com molhos diversos, desde uma simples manteiga com ervas até um molho denso de carne. Casamentos sempre perfeitos.

A receita tradicional de gnocchi pode ser incrementada. É possível acrescentar manteiga ao preparo, queijo parmesão, noz moscada. Tudo isso dará mais sabor às massinhas, agregará complexidade ao preparo final.

O segredo, na hora do preparo, é deixar secar bem a batata (ou outro ingrediente utilizado), antes de amassá-la ou passar pelo espremedor.  Uma vez amassadas as batatas, entra-se com a farinha, o ovo, se quiser colocar (algumas pessoas não usam ovo). Tudo deve ser bem misturado e amassado para resultar num preparo macio e homogêneo. Aí é só esticar e cortar.

A proporção de farinha varia segundo o ingrediente e a receita. Quanto menos farinha pegar o preparo, mais sobressairá o sabor do ingrediente principal (batata, abóbora, mandioquinha etc). E mais tenro ficarão os gnocchi.

Vinho - A batata é um ingrediente neutro, quando o assunto é harmonização. Ela combina com brancos e tintos. O que determinará o vinho será o molho. Uma manteiga de sálvia ou pesto de manjericão casará bem com um branco semi-aromático, um Pinot Grigio, Sauvignon Blanc, Viognier, Encruzado. Gnocchi al Sugo será muito bem escoltado por um tinto leve, de Sangiovese, Merlot. Já um molho de carne, denso, um bolognesa ficará excelente com um bom Syrah, um Barbera, um tinto Alentejano, um tinto espanhol de Crianza. Por aí.

Na sequência, uma receita do Gnocchi de Batatas:


Ingredientes:

1 kg de batatas
Cerca de 150 g de farinha de trigo
1 gema
água e sal para cozinhar as batatas


Modo de fazer:

  • Cozinhe as batatas com a pele, em água e sal.
  • Escorra a água, retire a pele e deixe as batatas perderem o excesso de água do cozimento.
  • Amasse as batatas com um garfo ou passe-as pelo espremedor.
  • Junte a gema e a farinha de trigo (comece colocando apenas 100 g de farinha).
  • Misture e amasse tudo. Se precisar, acrescente mais um pouco de farinha.
  • A massa deve ficar macia e desgrudar das mãos.
  • Enfarinhe uma superfície, faça tiras com a massa e corte os gnocchi.
  • Cozinhe em água fervente levemente salgada.
  • Quando boiarem, retire e sirva com o molho de sua preferência.


terça-feira, 12 de maio de 2015

Rabada: o saboroso último pedaço do boi


Coda alla Vaccinara ou Rabada com Agrião Salteado e Gnocchi de Aipim (Foto de João Lombardo)

Rabada, Coda alla Vaccinara, Oxtail, Queue de Boeuf, Sopa de Rabo de Boi, Kkori Gomtang. Esses são os nomes de pratos feitos com o rabo do boi em países diversos: Brasil, Itália, Inglaterra, França, Portugal e Coreia, para citar alguns. Preparos originalmente populares, criados para aproveitar tudo do boi. A parte pobre, que hoje ganha sofisticação, novas apresentações e nomes às vezes pomposos para atrair a atenção dos comensais. Pratos suculentos, untuosos, estruturados e cheios de sabor.

Preparo regularmente a rabada, de maneiras diversas. Promovo pequenas alterações nos ingredientes, de acordo com o objetivo desejado. Se quero fazer à moda italiana, uso vinho e uma dose maior de tomate. Se vou fazer à moda brasileira, coloco pimentão e aipim. E dou uma cutucada na pimenta. Por aí. Sempre preparo, para servir junto, uma verdura salteada. Normalmente, agrião.

Rica em gelatina, a carne do rabo bovino gera molhos densos, com muita untuosidade. O cozimento em panela aberta dura de três a quatro horas, em fogo baixo. Na panela de pressão, 45 minutos com a válvula chiando são suficientes para amolecer a carne. Com 50, 55 minutos de pressão, a carne desgruda do osso. E aí é possível desfiar a carne, preparando um delicioso ragù à moda antiga.

A rabada transita hoje entre as chamadas “alta” e “baixa” gastronomias. Nos restaurantes populares, ela é servida em grandes porções coletivas ou generosos  pratos individuais. A preços igualmente populares. Em restaurantes sofisticados, ela ganha apresentações elegantes, acompanhamentos requintados e nomes estrangeiros ou diferentes, como Rabada Desconstruída ou Ragù de Rabada (quando desfiada). Com isso, ganha valor gastronômico e, consequentemente, preços mais elevados.

Esse quadro tendo como protagonista a rabada mostra que comida boa foge a clichês e rótulos. Um prato popular pode ser também sofisticado. Tudo depende do local em que é preparado, da técnica utilizada para faze-lo e da forma como é apresentado e servido. No restaurante do posto de gasolina à beira da estrada ou no bar alo lado do estádio de futebol é uma coisa. No restaurante do chef, com todo o cerimonial da alta cozinha, é outra. Mas o princípio é o mesmo. O que vale é ter uma carne de qualidade, a boa conjugação dos temperos e ingredientes, o cuidado no preparo. Depois, é dar ao prato o conceito da casa.

Para acompanhar uma rabada, um tinto de bom corpo e estrutura é sempre companheiro. Tintos de Cabernet Sauvignon, Syrah, um Amarone, um Barolo, um Tempranillo de Reserva, um Douro ou Alentejo tintos. 

Se a pedida for cerveja, uma Strong Golden Ale ou cervejas escuras como a Dunkel, Porter ou Imperial Stout.

Na sequência, uma receita de rabada à brasileira.

 A rabada, durante o cozimento (Foto de João Lombardo)

Rabada à Brasileira com Agrião e Gnocchi di Aipim

Ingredientes para fazer a rabada:

2 kg de rabo de boi
200 g de bacon picadinho
2 cebolas grandes picadas em cubinhos
4 dentes de alho grandes bem picadinhos
½ pimentão amarelo picado em cubinhos
400 g de tomates pelados
1 amarrado de talos de salsinha
2 folhas de louro
250 ml de vinho tinto
1 colher de sopa de vinagre
1 pimenta dedo-de-moça sem sementes, picada em cubinhos
1 litro de caldo de carne, de preferência caseiro
Sal oqb
Pimenta do reino oqb
Farinha de trigo oqb
2 maços de agrião
100 ml de azeite de oliva


Ingredientes para fazer os gnocchi:

1 kg de aipim
1 ovo para dar liga
Farinha oqb para ligar
sal


Modo de fazer os gnocchi:

  • Coloque água para ferver numa panela.
  • Quando estiver fervendo, tempere com sal.
  • Assim que a água levantar fervura novamente, coloque os pedaços de aipim para cozinhar.
  • Cozinhe até que o aipim fique tenro. 
  • Escorra até que os pedaços fiquem bem secos.
  • Passe o aipim pelo espremedor. 
  • Coloque o ovo e cerca de 100 g de farinha. 
  • Amasse até obter uma massa homogênea e macia. 
  • Se precisar, coloque um pouco mais de farinha para ligar.
  • Estique tiras de massa de mais ou menos 1 cm de diâmetro, sobre uma superfície enfarinhada.
  • Corte os gnocchi com cerca de 1 cm de comprimento.
  • Ferva outra panela com água já salgada.
  • Coloque os gnocchi para cozinharem.
  • Quando boiarem na água, estão prontos.
  • Retire e envolva os gnhocchi com azeite de oliva, conservando quente até a hora de servir.

Modo de fazer a rabada:

  • Retire o excesso de gordura do rabo do boi.
  • Lave bem a carne, para tirar o excesso de sangue. Seque bem.
  • Numa panela de fundo grosso, aqueça cerca de 30 ml de azeite.
  • Passe os fragmentos do rabo do boi pela farinha de trigo e bata para tirar o excesso.
  • Frite, aos pouco, o rabo do boi, para selar os pedaços. Reserve a carne selada.
  • Na mesma panela, coloque o bacon e deixe fritar.
  • Acrescente os pimentões, a cebola e o alho e deixe refogar por cerca de 5 minutos.
  • Em seguida, acrescente a pimenta dedo-de-moça.
  • Coloque os tomates pelados picados com o suco dos mesmos. Mexa e deixe levantar fervura.
  • Retorne o rabo do boi à panela e deixe tudo refogar junto por alguns minutos.
  • Coloque a colher de vinagre e misture bem.
  • Acrescente o vinho e deixe ferver uns três minutos.
  • Acrescente o caldo de carne, até cobrir todos os pedaços do rabo de boi.
  • Coloque as folhas de louro e o amarrado de talos de salsa.
  • Dê um toque de pimenta do reino.
  • Corrija o sal.
  • Se for cozinhar em panela aberta, baixe o fogo de deixe cozinhar por pelo menos três horas, tirando a espuma que se forma na superfície.
  • Se for cozinhar em panela de pressão, feche a panela e, quando a válvula começar a chiar, deixe cozinhar por cerca de 45 minutos, se quiser os pedaços inteiros, ou 55 minutos, se for desfiar a carne.
  • Quando a carne estiver pronta, salteie o agrião numa frigideira com cerca de 60 ml de azeite de oliva.

Montagem:

  • Coloque um pouco de gnocchi no centro de um prato. 
  • Cubra com a rabada.
  • Cubra a rabada com agrião.
  • Sirva quente.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

À mesa no Zé da Mouraria


É uma casa portuguesa, com certeza (foto de João Lombardo)

Portugal é um país repleto de pequenas tascas, marisqueiras e restaurantes que oferecem comida típica e contemporânea a preços muito justos. Fui presenteado com uma indicação, recentemente, o Zé da Mouraria, restaurante lisboeta que oferece uma boa mostra da típica e legítima culinária portuguesa. A preços excelentes.

O Zé da Mouraria fica na rua João Outeiro número 24, entrada do famoso bairro Mouraria, formado a partir do ano de 1.147, depois que o rei D. Afonso Henriques conquistou Lisboa e confinou os mouros nessa parte da cidade.  O bairro está localizado numa encosta da colina de São Jorge, à sombra do majestoso castelo que tem o mesmo. Escadarias e ruas estreitas, onde roupas balançam penduradas junto às janelas e varandas das casas e edifícios, marcam o cenário urbano local desse bairro que tem forte ligação com o fado. Nasceram ali alguns famosos compositores e cantores do gênero.

Roupas nas janelas, cena típica da Mouraria (Foto de João Lombardo)


O fado, como inspiração (foto de João Lombardo)

O Zé da Mouraria é um restaurante pequeno. Mas é bastante aconchegante. O salão tem as paredes parcialmente revestidas de azulejos. Na parte superior, quadros e muitas fotografias. O chef é um português do Minho, Virgílio Oliveira. Ele comprou a casa há pouco mais de 15 anos. Conta que o endereço é centenário e que, no passado, se chamava “Zé dos Grelhados”. Virgílio deixou os hotéis, inclusive em Luanda, e levou sua experiência para a pequena cozinha do Zé da Mouraria.

O salão, com azulejos, fotos, quadros (foto de João Lombardo)

“Servimos uma comida à moda antiga”, afirma Virgílio. A cozinha é aberta e pode-se ver todo o trabalho de confecção e montagem dos pratos. O que se põe à mesa são receitas repetidas há 90, 100 anos pelas donas-de-casa portuguesas. Com pequenas mudanças, claro. Por exemplo, no lugar de banha, usa-se azeite, uma gordura vegetal. Mas isso, segundo Oliveira, não compromete o sabor das receitas, ao contrário, melhora.

Joaquinzinhos, chouriça, arroz de coentros, queijo, azeitonas (foto de João Lombardo)

Comecei pelas azeitonas, o pão e o queijo de leite de ovelha. Vieram, então, Joaquinzinhos Fritos, pequenos carapaus enfarinhados e temperados apenas com sal. Simplesmente deliciosos. Eles lembraram-me os deliciosos lambaris, peixes que pescávamos, nos rios, fritávamos e comíamos com cerveja. Virgílio serviu também chouriça (linguiça curada de carne) frita em azeite com alho e piri-piri fresco (a pimenta dedo-de-moça). Essa entrada, mais forte e igualmente muito saborosa, foi acompanhada por um perfumado arroz de coentros, um prato cheio para quem aprecia essa erva. Tudo feito na hora, à minha frente.

Veio então o astro da refeição: “Arroz de Pato Antigo”. A porção revelou-se gigantesca (assim como a dos demais pratos). A propósito, em Portugal porção se chama dose. E aquela era dose para pelo menos quatro pessoas.  

Arroz de Pato Antigo (foto de João Lombardo)

Acompanhei a finalização do preparo do Arroz de Pato. Virgílio explicou-me os passos da receita, segundo a tradição. De véspera, tempera-se o pato. No dia seguinte, a carne é levada para assar até ficar bem dourada. Aí, o pato já assado vai para a panela, para preparar o caldo onde será cozido o arroz. O caldo é preparado com cebola, alho e ervas. Nesse cozimento, o sabor do pato é transferido para o caldo. Retirado do caldo, a carne do pato é desfiada e reservada. E o arroz, cozido no caldo. Fritam-se fatias de chouriça e de bacon, para guarnecer o enformado.

Na montagem, uma generosa porção de arroz cozido em caldo de pato cobre o fundo de uma vasilha de alumínio espesso. Sobre o arroz entra a carne de pato desfiada, generosamente, coberta por mais um pouco de arroz. Sobre o arroz são intercaladas fatias de bacon e chouriça. O prato é levado para o forno, para dar uma rápida assada.

O leite-creme, antes de ser queimado (foto de João Lombardo)

O que vem à mesa é um preparo clássico, bem temperado, arroz cozido no ponto, pato tenro e saboroso. O Arroz de Pato à Antiga é um dos pratos mais pedidos no Zé da Mouraria. Ele brilha ao lado de outros como o Bacalhau Assado (em churrasqueira) com Batatas ao Murro e Grãos; Iscas à Portuguesa; Chocos no Alhinho (sépia); Cabrito à Moda Minhota; Antigo Bife ao Molho de Cerveja e a Carne de Porco no Alguidar, feita com vinho Verde tinto. Para citar alguns.

Acompanhei a refeição com o vinho da casa, o Xico Pé Descalço, um tinto macio elaborado na região de Palmela, cujo rótulo traz uma caricatura de Virgílio Oliveira. Um vinho versátil, uma síntese para os pratos do cardápio. No final, Leite Creme queimado à mesa.

 O vinho Xico Pé Descalço (foto de João Lombardo)

Cheguei ao restaurante próximo às 14 horas, num dia de semana. A casa já não estava tão cheia. Fui prontamente e bem atendido. Tanto o chef quanto os garçons mostraram-se muito atenciosos. Os pratos, com porções generosas, não demoraram e boa parte deles custava menos de 20 Euros. Um pequeno restaurante que entrou para a minha lista dos preferidos de Lisboa.