É uma casa portuguesa, com certeza (foto de João Lombardo)
Portugal é um país repleto de pequenas tascas, marisqueiras
e restaurantes que oferecem comida típica e contemporânea a preços muito justos.
Fui presenteado com uma indicação, recentemente, o Zé da Mouraria, restaurante
lisboeta que oferece uma boa mostra da típica e legítima culinária portuguesa.
A preços excelentes.
O Zé da Mouraria fica na rua João Outeiro número 24, entrada
do famoso bairro Mouraria, formado a partir do ano de 1.147, depois que o rei
D. Afonso Henriques conquistou Lisboa e confinou os mouros nessa parte da
cidade. O bairro está localizado numa
encosta da colina de São Jorge, à sombra do majestoso castelo que tem o mesmo.
Escadarias e ruas estreitas, onde roupas balançam penduradas junto às janelas e
varandas das casas e edifícios, marcam o cenário urbano local desse bairro que
tem forte ligação com o fado. Nasceram ali alguns famosos compositores e
cantores do gênero.
Roupas nas janelas, cena típica da Mouraria (Foto de João Lombardo)
O Zé da Mouraria é um restaurante pequeno. Mas é bastante
aconchegante. O salão tem as paredes parcialmente revestidas de
azulejos. Na parte superior, quadros e muitas fotografias. O chef é um português do Minho, Virgílio
Oliveira. Ele comprou a casa há pouco mais de 15 anos. Conta que o endereço é
centenário e que, no passado, se chamava “Zé dos Grelhados”. Virgílio deixou os hotéis, inclusive em Luanda, e levou sua experiência para a pequena
cozinha do Zé da Mouraria.
O salão, com azulejos, fotos, quadros (foto de João Lombardo)
“Servimos uma comida à moda antiga”, afirma Virgílio. A
cozinha é aberta e pode-se ver todo o trabalho de confecção e montagem dos
pratos. O que se põe à mesa são receitas repetidas há 90, 100 anos pelas
donas-de-casa portuguesas. Com pequenas mudanças, claro. Por exemplo, no lugar
de banha, usa-se azeite, uma gordura vegetal. Mas isso, segundo Oliveira, não
compromete o sabor das receitas, ao contrário, melhora.
Joaquinzinhos, chouriça, arroz de coentros, queijo, azeitonas (foto de João Lombardo)
Comecei pelas azeitonas, o pão e o queijo de leite de
ovelha. Vieram, então, Joaquinzinhos Fritos, pequenos carapaus enfarinhados e
temperados apenas com sal. Simplesmente deliciosos. Eles lembraram-me os
deliciosos lambaris, peixes que pescávamos, nos rios, fritávamos e comíamos com
cerveja. Virgílio serviu também chouriça (linguiça curada de carne) frita em
azeite com alho e piri-piri fresco (a pimenta dedo-de-moça). Essa entrada, mais
forte e igualmente muito saborosa, foi acompanhada por um perfumado arroz de
coentros, um prato cheio para quem aprecia essa erva. Tudo feito na hora, à minha
frente.
Veio então o astro da refeição: “Arroz de Pato Antigo”. A
porção revelou-se gigantesca (assim como a dos demais pratos). A propósito, em
Portugal porção se chama dose. E aquela era dose para pelo menos quatro
pessoas.
Arroz de Pato Antigo (foto de João Lombardo)
Acompanhei a finalização do preparo do Arroz de Pato.
Virgílio explicou-me os passos da receita, segundo a tradição. De véspera,
tempera-se o pato. No dia seguinte, a carne é levada para assar até ficar bem
dourada. Aí, o pato já assado vai para a panela, para preparar o caldo onde
será cozido o arroz. O caldo é preparado com cebola, alho e ervas. Nesse
cozimento, o sabor do pato é transferido para o caldo. Retirado do caldo, a
carne do pato é desfiada e reservada. E o arroz, cozido no caldo. Fritam-se
fatias de chouriça e de bacon, para guarnecer o enformado.
Na montagem, uma generosa porção de arroz cozido em caldo de
pato cobre o fundo de uma vasilha de alumínio espesso. Sobre o arroz entra a
carne de pato desfiada, generosamente, coberta por mais um pouco de arroz.
Sobre o arroz são intercaladas fatias de bacon e chouriça. O prato é levado
para o forno, para dar uma rápida assada.
O leite-creme, antes de ser queimado (foto de João Lombardo)
O que vem à mesa é um preparo clássico, bem temperado, arroz
cozido no ponto, pato tenro e saboroso. O Arroz de Pato à Antiga é um dos
pratos mais pedidos no Zé da Mouraria. Ele brilha ao lado de outros como o
Bacalhau Assado (em churrasqueira) com Batatas ao Murro e Grãos; Iscas à Portuguesa;
Chocos no Alhinho (sépia); Cabrito à Moda Minhota; Antigo Bife ao Molho de
Cerveja e a Carne de Porco no Alguidar, feita com vinho Verde tinto. Para citar
alguns.
Acompanhei a refeição com o vinho da casa, o Xico Pé
Descalço, um tinto macio elaborado na região de Palmela, cujo rótulo traz uma
caricatura de Virgílio Oliveira. Um vinho versátil, uma síntese para os pratos
do cardápio. No final, Leite Creme queimado à mesa.
Cheguei ao restaurante próximo às 14 horas, num dia de
semana. A casa já não estava tão cheia. Fui prontamente e bem atendido. Tanto o
chef quanto os garçons mostraram-se
muito atenciosos. Os pratos, com porções generosas, não demoraram e boa parte
deles custava menos de 20 Euros. Um pequeno restaurante que entrou para a minha
lista dos preferidos de Lisboa.
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